segunda-feira, 26 de maio de 2014

A tecnologia precisa estar presente na sala de aula

Pesquisadora da PUC-SP alerta que o currículo escolar não pode continuar dissociado das novas possibilidades tecnológicas




     Em entrevista para NOVA ESCOLA ,Maria Elizabeth Bianconcini de Almeida, coordenadora e docente do Programa de Pós-Graduação em Educação: Currículo, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), especialista no uso de novas tecnologias em Educação, formação docente e gestão falou sobre os problemas na formação inicial e continuada dos professores para o uso de TICs e de como integrá-las ao cotidiano escolar.

             1. O que é o Webcurrículo?

Maria Elizabeth Bianconcini de Almeida: É o currículo que se desenvolve por meio das tecnologias digitais de informação e comunicação, especialmente mediado pela internet. Uma forma de trabalhá-lo é informatizar o ensino ao colocar o material didático na rede. Mas o webcurrículo vai além disso: ele implica a incorporação das principais características desse meio digital no desenvolvimento do currículo. Isto é, implica apropriar-se dessas tecnologias em prol da interação, do trabalho colaborativo e do protagonismo entre todas as pessoas para o desenvolvimento do currículo. É uma integração entre o que está no documento prescrito e previsto com uma intencionalidade de propiciar o aprendizado de conhecimentos científicos com base naquilo que o estudante já traz de sua experiência. O webcurrículo está a favor do projeto pedagógico. Não se trata mais do uso eventual da tecnologia, mas de uma forma integrada com as atividades em sala de aula.

2. O uso das TICs facilita o interesse dos alunos pelos conteúdos?

Maria Elizabeth Bianconcini de Almeida: Sim, pois estamos falando de diferentes tecnologias digitais, portanto de novas linguagens, que fazem parte do cotidiano dos alunos e das escolas. Esses estudantes já chegam com o pensamento estruturado pela forma de representação propiciada pelas novas tecnologias. Portanto, utilizá-las é se aproximar das gerações que hoje estão nos bancos das escolas.

3. Como integrar efetivamente essas tecnologias ao currículo escolar e ao projeto pedagógico?

Maria Elizabeth Bianconcini de Almeida: A primeira coisa é ter a tecnologia disponível. É por isso que não se observam resultados tão favoráveis quando há apenas um laboratório para toda a escola. A tecnologia tem de estar na sala de aula, à mão no momento da necessidade. Pode ser um pequeno laboratório na sala ou um computador por aluno. Não estou falando exclusivamente de computador, mas de diversas tecnologias digitais

4. A ideia do computador como único acesso às TICs é ultrapassada?

Maria Elizabeth Bianconcini de Almeida: Sem dúvida! Não que o laboratório não deva existir. Ele precisa estar na escola, mas passa a ser ressignificado. O laboratório é para uma atividade mais sofisticada, que exige recursos de uma reconfiguração, digamos, mais pesada e atualizada. Essa tecnologia precisa estar à mão para a produção de conhecimento dos alunos à medida que surja a necessidade.

5. Os telefones celulares já são amplamente acessíveis e oferecem muitas possibilidades didáticas - o trabalho com fotos, filmagem, mensagens e mesmo com a internet , mas na maioria das escolas prefere proibi-los . Não é uma atitude retrógrada?

Maria Elizabeth Bianconcini de Almeida: Vetar o uso não adianta nada porque o aluno vai levar e utilizar ali, embaixo da carteira. É preciso criar estratégias para que os celulares sejam incorporados, pois oferecem vários recursos e não custam nada à escola. A proibição só incentiva o uso escondido e a desatenção na dinâmica da aula. Geralmente os estudantes, inclusive de escolas públicas, têm celular e o levam a todos os lugares. Ele é o instrumento mais usado pela população brasileira. Basta olhar as estatísticas. O que o webcurrículo prevê é o uso integrado da tecnologia. Os alunos, com seu celular, podem fazer o registro daquilo que encontram numa pesquisa de campo. Podem trabalhar textos e fotos e preparar pequenos documentários em vídeo. Isso precisa estar integrado ao conteúdo.

6. E como enfrentar as questões éticas e desenvolver uma postura crítica em relação a essas mídias?

Maria Elizabeth Bianconcini de Almeida: Da mesma forma que nos preocupamos com essas questões em todos os campos. A tecnologia não é uma exceção, até porque ela potencializa o trabalho com diversas mídias, com imagens e textos. Ela facilita a cópia, o plágio. Mas não que isso não existisse antes. O bom é que, assim como simplifica a fraude, também facilita a detecção. E o que nos cabe como educadores? Cabe ajudar o aluno a entender o que é ético para que ele possa se pautar por uma conduta adequada aos dias de hoje, mas baseado em princípios que sempre existiram. A única novidade é o meio.

7. O que é preciso para que a tecnologia seja integrada ao currículo?

Maria Elizabeth Bianconcini de Almeida: O currículo da sala de aula não é apenas o prescrito. Ele se desenvolve do que emerge das experiências de alunos e professores, do diálogo entre eles. Nesse sentido, o uso das TICs pode auxiliar muito porque, quando é desenvolvido um currículo mediatizado, é feito o registro dos processos e com essa base é possível identificar qual foi o avanço do aluno, quais as suas dificuldades e como intervir para ajudá-lo. Isso é pouco aproveitado ainda

8. Uma pesquisa de 2009 da Fundação Victor Civita ( FVC) mostrou que 72% dos entrevistados não se sentem seguros em utilizar computadores na escola. A graduação não forma professores para lidar com a tecnologia?

Maria Elizabeth Bianconcini de Almeida: Não, a formação inicial não está dando conta disso. Temos vários estudos em que o professor reconhece que a tecnologia é importante e ele quer utilizá-la. Mas não é apenas porque tem pouco domínio que não a emprega. Para integrar as tecnologias, é preciso deter tanto o domínio instrumental como o conteúdo que deve ser trabalhado, as próprias concepções de currículo e as estratégias de aprendizagem. Tudo isso precisa ser integrado numa formação que alguns especialistas já chamam de "nova pedagogia"

9. Há algum trabalho de formação para as TICs sendo feito hoje no país?

Maria Elizabeth Bianconcini de Almeida: Tem havido muitos programas públicos de formação continuada, entretanto há uma rotatividade enorme dos professores e isso se perde. Precisamos investir na ampliação do acesso às tecnologias e, principalmente, nessa formação.

10. O que devem contemplar os cursos de formação de professores? Especialistas dizem que eles devem tratar de atividades ligadas aos conteúdos...

Maria Elizabeth Bianconcini de Almeida: Não se pode separar forma de conteúdo. É preciso integrar o conteúdo à tecnologia, às estratégias de aprendizagem e às de ensino. Tudo isso precisa ser relacionado e analisado pelo professor. Mas é preciso cuidar da gestão desses programas de formação e principalmente da mediação pedagógica que ocorre nessa formação. Tanto as universidades públicas como as privadas precisam trabalhar com a realidade da sala de aula e estar comprometidas com a reflexão sobre a prática

11. É possível para a escola acompanhar o ritmo de avanço das tecnologias?

Maria Elizabeth Bianconcini de Almeida: Não é necessário que isso ocorra. O importante é que o professor tenha oportunidade de reconhecer as potencialidades pedagógicas das TICs e aí assim incorporá-las à sua prática. Nem todas as tecnologias que surgirem terão potencial. Outras inicialmente podem não ter, mas depois o quadro muda. Primeiro, é preciso utilizar para si próprio para depois pensar sobre a prática pedagógica e as contribuições que as TICs podem trazer aos processos de aprendizagem. Daí a importância dos programas de formação.

12. A ideia de um professor diante de um quadro falando para 30 alunos sentados, ouvindo e anotando em seu caderno tem futuro?

Maria Elizabeth Bianconcini de Almeida: É uma coisa relativizada e não será abandonada. O professor detém um conhecimento científico maior e é absolutamente normal que ele exponha uma aula. Só que isso não pode ser um monólogo nem imperar o tempo inteiro. É fundamental que diferentes dinâmicas ocorram em sala de acordo com o projeto pedagógico.

Texto: Elisângela Fernandes




* A entrevista na intergra encontra-se: http://educarparacrescer.abril.com.br/gestao-escolar/tecnologia-na-escola-618016.shtml

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